Sonhos envelhecendo

Por Priscila Lapa

Ingressar em uma universidade é o sonho de muitos jovens mundo afora, pela perspectiva de um futuro (mais) promissor, inclusive pela realização que se formar em algo de que se gosta muito pode proporcionar. Pois bem: a pandemia está tornando este sonho um pesadelo. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), mais de 1,3 bilhão de alunos de todo o mundo foram afetados em 2020 pelo fechamento das escolas e universidades devido ao isolamento social necessário para combater a pandemia.
Além dos desafios de adaptação para viabilizar as aulas on-line, hoje a comunidade se depara com o corte de R$ 1 bilhão imposto pela LOA (Lei Orçamentária Anual) 2021 às universidades federais, o que comprometeu o funcionamento de serviços das 69 instituições mantidas pela União, segundo as próprias universidades. As instituições vieram a público revelar que não têm como manter compromissos com o ensino, a pesquisa e a extensão neste ano.

Pelo país, já há corte de bolsas e atividades de extensão, o que, para muitos estudantes, já significa inviabilizar a manutenção dos estudos. Muitos pagam os pacotes de internet de suas casas com os recursos da bolsa. Essa é a realidade, que não destoa muito daqueles que optam pelo ensino privado ou a quem não resta outra opção.
A situação econômica do país pode afetar diretamente as instituições privadas de ensino superior, aumentando a taxa de evasão, que está altamente correlacionada com a empregabilidade. Essa tendência pode impactar significativamente essas instituições que já lutavam contra o alto número de alunos desistentes, nos últimos anos, com a redução no investimento em políticas públicas, como oferta de financiamento estudantil (FIES). Outro fenômeno correlacionado é o da inadimplência, que também afetam a empregabilidade dos estudantes.

Pouco se vê qualquer mobilização da classe política sobre o tema. Não se ouvem ruídos de norte a sul do Brasil. Parece que se trata de um fenômeno menor para quem quer participar do debate político. Parece, inclusive, que não temos mais Ministério da Educação. O pouco que ouço falar do ministro Milton Ribeiro é a defesa de homeschooling e problemas no ENEM.

Recentemente, a colocação mal arrumada do ministro Paulo Guedes sobre o Fies, para quem a política só serviu para enriquecer meia dúzia de empresários, exemplificando com o caso do filho do porteiro que tirou zero em todas as provas, mas foi parar na universidade. Para os filhos dos menos abastados deste país, o caminho da universidade ficou bem mais longo. E, assim, por gerações, o que restará é o sonho de ter o diploma.
Sim, nesse caso, sonhos envelhecem.

Priscila Lapa é cientista política e jornalista