Por Priscila Lapa
As pessoas parecem estar à espera de um milagre, de uma fórmula mágica, que possa nos tirar instantaneamente do estado de crise e nos alçar ao paraíso. E, claro, uma façanha como essa só pode vir das mãos de um salvador, um herói, um semideus. O senso de realidade parece distante daqueles que enveredam pelo atalho cognitivo mais fácil: a culpa é do outro, a crise nem é tão grave assim.
Como na infância tínhamos que escolher entre um sabor de sorvete ou outro, nos convenceram que era preciso fazer a opção entre salvar as vidas ou salvar a economia. Existe muita pouca disposição para se transitar pelo razoável. Cenários de guerra e devastação exigem resiliência, esforço coletivo.
No mínimo, um pouco mais de empenho para o diálogo já poderia nos ajudar. Nós, sociedade; e eles, os políticos. Mas o senso de responsabilidade que julgamos não nos caber, cobramos dos demais. Preferimos relativizar, dizer que, com jeitinho, dá pra levar uma vida normal e conviver com a pandemia. A voracidade do vírus em sua segunda onda no Brasil já provou que não dá. Mas enquanto quem perde a vida é o outro, tá tudo certo.
O pacto em 2020 era a retomada das atividades sob protocolos sanitários. Todos juram que seguiram e quem falhou então foi a ciência. O cidadão burla o isolamento e assegura que estudos provam que o lockdown agrava a pandemia. Não faz sentido algum.
Repito: perdemos o foco. Não sabemos o que cobrar, a quem cobrar. As idas e vindas da compra de vacinas viraram piada internacional. Mesmo assim, ainda seguimos discutindo cloroquina e ampliando covas. Ainda temos crivo ideológico para gerir a maior crise sanitária da história. O líder maior da Nação vai a público e afirma: “Em todo canto está morrendo gente”. É como um endividado se orgulhar porque não é o único que deve. Mas estamos falando de vidas.
Enquanto tiver gente para amenizar e dizer que não é defensor radical dos políticos, não é direita nem esquerda, mas que o presidente tem carta branca para continuar negando a gravidade da crise, ficaremos nessa. É leviano achar que tudo depende do presidente. Mas líderes existem para gerir crises, para abrir frentes, sabendo ouvir e sabendo ler cenários. Sabendo usar os recursos disponíveis, ao seu alcance, para minimizar perdas e não desdenhar delas. Falta de aviso não é.