Mais Fé no Onipotente

Por Marcello Gadelha

A abertura de templos e Igrejas para a realização de cerimônias religiosas presenciais durante a pandemia vem gerando um debate em que nos deparamos com o conflito entre a liberdade de crença e culto e o direito à proteção à vida.


Segundo o art. 5º, VI, da Constituição Federal, “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”. A liberdade de crença decorre da Laicidade do Estado brasileiro, e, portanto, está assegurado enquanto direito fundamental.


Do mesmo modo, a Constituição Federal, no seu artigo 5º, abre em seu caput a proteção à vida afirmando que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.” Não se pode negar a relação intrínseca do direito à vida com o princípio da dignidade da pessoa humana. Isso porque, sem a devida proteção do direito à vida, não há como exercer a dignidade da pessoa humana e os direitos dela decorrentes, inclusive o da liberdade de culto e crença.


Há um brocardo jurídico que vem dos tempos da Roma Antiga, que diz: “ubi societas, ibi jus” – onde está a sociedade, está o direito. Portanto, o direito segue a evolução social, estabelecendo normas para disciplinar os fenômenos já existentes e os que estão por vir.


Em tempos de pandemia, inevitavelmente, o direito à vida assume ainda mais a centralidade do protecionismo constitucional, diante da escalada de mortes decorrentes do momento pandemônico na saúde pública pela falta de vacina e pelo avanço do vírus.


O direito à liberdade de crença e culto deve ser exercido e garantido como qualquer outro em tempos em que a vida não esteja sob ameaça constante. Além disso, a ameaça do vírus coloca em risco toda uma coletividade que não respeita o ateu nem o judeu, nem o crente e o agnóstico.
Cumpre aqui o registro de tal indagação. Se Deus é onipotente e onipresente, e todo rito litúrgico pode ser realizado à distância de forma remota, online, sem prejuízo à comunhão ou à prática religiosa, por quê se abrir os templos?


Na verdade, a insistência em manter aberto os templos religiosos demostram a falta de uma visão mais elevada em que o Deus pode e deve estar em qualquer lugar não necessariamente se a porta se encontra aberta ou fechada.
Por derradeiro, em tempos de pandemia a consciência cristã deve-se voltar para os que estão justamente do lado de fora das igrejas ou aos que não conseguem nem entrar quando as portas dos Templos estão livres. Neste sentido, a palavra de lucidez, neste momento, é proteger vidas e não as colocar em risco.


Por fim, mais fé no Onipresente e Onipotente que está em todos os lugares, independentemente de a porta materialmente encontrar-se temporiamente fechada, é o que se espera daqueles que professam seus ensinamentos. E também, que acreditem que o vírus é letal, não devendo relativizar qualquer tipo de aglomeração.

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